Entrevista com o Coronel Sued Lima!


Para o militar da reserva, as mudanças de foco na defesa do País, priorizando a Amazônia, são necessárias e não comprometem a segurança de outras regiões, já que são “estratégicas”.

A transferência de unidades militares para os estados da fronteira oeste do País representa risco para a segurança dos locais de onde saíram?

O Ceará, por exemplo, perdeu o 10º Grupo de Artilharia de Campanha para Rondônia e uma unidade da Aeronáutica para o Rio Grande do Norte.

A distribuição de unidades militares pelo território nacional obedece a critérios de ordem estratégica. Certamente, esses critérios, analisados cuidadosamente nos foros adequados, têm determinado a necessidade de uma presença mais intensa das forças armadas brasileiras na região amazônica. Como sempre há limitações orçamentárias, tais necessidades são cobertas pelo remanejamento das unidades existentes, no lugar de se criarem novas organizações. Foi o que se verificou no caso do 10º Grupo de Artilharia de Campanha.

Já a ida do 1º/4º Grupo de Aviação de Fortaleza para Natal atendeu mais a questões de natureza operacional. Trata-se de uma unidade de caça, que aqui cumpria missões de treinamento de combate, o que vinha se revelando impróprio para uma pista compartilhada com crescente movimento de aeronaves comerciais.

Além disso, o processo de urbanização da cidade praticamente cercou o aeroporto Pinto Martins, aumentando o potencial de perigo de acidentes graves, representado, por exemplo, pela decolagem de um avião carregado de armamento com o compulsório sobrevoo de áreas densamente habitadas.

Como o senhor avalia a mudança do foco de defesa do País, privilegiando a Amazônia?

Avalio como uma medida necessária e oportuna. As chamadas hipóteses de guerra, que determinam as prioridades de posicionamento das unidades militares pelo território nacional, oscilam conjunturalmente. No século XIX e no início do século XX, o potencial maior de conflitos externos centrava-se no Sul do País, onde foram estacionadas dezenas de quartéis do Exército Brasileiro.

A partir de meados do século passado, com a guerra na Europa e no Atlântico Sul, parcela importante de medidas de defesa migraram para o litoral brasileiro e a FAB, por exemplo, dispôs um total de dez bases aéreas em cidades litorâneas.

Hoje, os olhos do mundo se voltam para a Amazônia, e, nesses olhares, há de tudo: interesses ambientalistas, econômicos, políticos e hegemônicos. Já era hora de as forças armadas brasileiras voltarem suas prioridades para essa tão rica quanto vulnerável região.

As estratégias de defesa na Amazônia são as mesmas no País?

O tipo de defesa de que necessita a Amazônia é mais de outra natureza do que a propriamente militar. Passa pelo permanente exercício de brasilidade com os habitantes da região, a promoção de sua identidade com a pátria brasileira, a fiscalização mais firme das inúmeras organizações que por lá atuam, com rigorosa investigação dos interesses que as movem, e a busca da preservação do patrimônio ambiental lá existente, tão violentamente atacado.

Considero, até por ter sido testemunha e partícipe, que, nesse contexto, as muitas tarefas atribuídas às forças armadas vêm sendo cumpridas.

Algumas instituições, como o Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz, associam a presença dos EUA na América Latina, a partir do retorno da sua Quarta Frota e bases militares, com os interesses no petróleo do pré-sal.

Os Estados Unidos são bastante ciosos de sua condição de potência hegemônica e têm demonstrado não descuidar de seus interesses econômicos em todos os cantos do planeta. Sempre agiram e continuam atuando por meio de intervenções políticas ou armadas em países de todos os continentes para impor sua vontade imperial em defesa do que chamam “liberdades democráticas”, que ganham diferentes configurações para cada caso: ou apoiando a derrubada de líderes eleitos pelas suas populações ou a manutenção de ditadores sanguinários.

Esses passos ostensivos no sentido de ativar bases militares em países sul-americanos, remontar uma poderosa frota naval e revigorar o Comando Sul, em Miami, são inequívocas ações estratégicas de demonstração e projeção de poder.

Deve-se a interesses políticos e econômicos ou ao narcotráfico, motivo alegado pelos EUA?

Na minha avaliação, prendem-se mais ao surgimento, na América Latina, de governos não alinhados com os interesses dos EUA do que propriamente com o combate ao narcotráfico ou a apropriação das reservas de petróleo recentemente descobertas na costa brasileira.

Aliás, com relação à produção de drogas, há um dado bastante curioso: recentemente foi divulgado que, quando o Taleban detinha o poder no Afeganistão (1996-2001), a produção de ópio foi totalmente desmontada no país, pois o líder do grupo, mulá Mohammad Omar, considerava o consumo da droga crime contra o Islã e ameaçava executar quem cultivasse a papoula. Atualmente, com a presença de tropas norte-americanas no país, a região voltou a ser a maior produtora de ópio no mundo.

As políticas de segurança implementadas são eficientes?

No fim do ano passado, o Presidente Lula aprovou a Estratégia Nacional de Defesa (END), documento fundamental para o estabelecimento de políticas de defesa. Mesmo os que eventualmente questionam pontos dessa formulação entendem que, com ela, um passo importante foi dado.

Exemplificando, em um de seus artigos, a Estratégia estabelece que a defesa do Brasil requer a reorganização da indústria bélica nacional, com prioridade para o desenvolvimento de capacitações tec-nológicas independentes. É o reconhecimento de que o Brasil somente atingirá o nível ideal para promover sua defesa quando, entre outras importantes condições, desenvolver a capacidade de produzir o seu próprio armamento.

Sued Lima é coronel-aviador da reserva da força aérea brasileira (FAB) e membro do observatório das nacionalidades.

Fonte: Poder Aéreo.

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